por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sábado, 23 de julho de 2011

NADANDO EM ÁGUAS CLARAS- Carlos Esmeraldo



Numa noite úmida de fevereiro, sentindo-me inadaptado à cidade grande e seus inúmeros rostos estranhos, vi-me, como que de repente, envolvido por uma onda acolhedora, que me lançou no meio de um mar de águas mornas, claras e aconchegantes. Meu corpo flutuava livremente, sem necessidade de esforço para me manter na superfície daquela água deliciosa. Ao meu lado, uma multidão de rostos desconhecidos também flutuava. O sentimento de cada um daqueles banhistas parecia fundir-se ao meu, num processo de unificação sobrenatural. Inexplicável descrever com precisão a emoção que sentíamos. Um bem-estar invadia nossas almas, e aquele prazer inesquecível, que toda criança experimenta num banho de piscina, era comum a todos os companheiros daquele inacreditável passeio aquático. Um velhinho simpático se aproximou de mim, sorrindo. Então comentei com ele:

– Que banho maravilhoso! Sinto-me outro homem. – Ele então me perguntou:

– Você não sabe onde está?

– Não. – Respondi. E enquanto a brisa nos transportava suavemente para a praia,
ele me disse:

– Você morreu. Estamos na vida eterna.

– Que bom! – Exclamei com alegria. – Agora vou rever meu pai e minha mãe, que
estão aqui! – Ao que fui imediatamente contrariado pelo bom velhinho:

– Já faz mais de dez mil anos que estou aqui, e ainda não encontrei nenhum conhecido.

– Também pudera. Há dez mil anos, a população do mundo não era nem duzentos mil habitantes. Agora, não, eu conheci muito mais gente que já morreu que o senhor. – Disse-lhe eu, todo convencido, enquanto, sem que nos déssemos conta, estávamos na praia. Era uma estreita faixa de terra espremida entre aquele lago mágico e um alto, que nos lembrava o morro do Seminário do Crato.

Na encosta dessa pequena elevação, uma multidão incalculável se espremia olhando para o topo da montanha. De repente, vi duas mocinhas conhecidas lá do Crato, que estudavam em João Pessoa, e haviam morrido num desabamento da casa em que moravam, numa noite de grande chuva. E disse pro meu amigo:

– Está vendo? Já encontrei duas conhecidas. Aquelas duas moças são lá do Crato. – Disse-lhe, em tom de vitória. Ele retrucou imediatamente:

– Aquelas duas moças tem dois mil anos que morreram. Elas viveram na época de Cristo. Não podem ser do Crato, porque essa cidade ainda não existia. – Completou o amigo. Em seguida, ele acrescentou:

– É hora de Jesus chegar.

Aquele velhinho transpirava bondade por todos os poros, e me transmitia uma segurança e bem-estar nunca antes experimentado. Ajeitei-me nas pontas dos pés para poder melhor visualizar o Mestre, ansiosamente esperado. O meu bom companheiro explicava que todos os dias, àquela mesma hora, o Senhor vinha nos visitar.

De repente, um forte clarão surgiu por trás de uma nuvem, e a multidão toda se agitava. Jesus estava chegando! À medida que Jesus se aproximava do morro, um vento forte balançava nossos cabelos e refrescava o forte calor daquela noite. O clarão aumentava de intensidade, fechando nossos olhos automaticamente. Fiz um esforço enorme para abrir meus olhos. Precisava ver Jesus. Naquele exato momento, a luz fluorescente do banheiro fora acesa, e o tique-taque do despertador me lembrava um novo dia de muito trabalho.

( do livro "No Azul Sonhado ")

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