Punta Del Este é a Miami do Cone Sul. Uma ponta no mar plena
de mansões, edifícios de luxo. De Cassinos iguais aos Zigurates da Mesopotâmia
onde os astros a serem observados são os semideuses desta mortalidade aderente
ao sucesso. E girava por suas ruas. Todas em longitude de sua ponta, aquela
espécie de bússola que parece nortear a imensa deságua do Rio de la Plata.
Um clima de Atlântico Sul: Leões Marinhos próximos ao píer, à
espreita que os restos do tratamento dos peixeiros retornam às águas onde
pescam. Uma face de endinheirados: inúmeras lanchas a condecorar o tédio de
tanta riqueza sem norte de aplicação social. Quando passava em frente ao velho
prédio da Marinha encontrou Che Guevara, o chefe da Missão Cubana, em passo
apressado para o desfecho da Oitava Reunião de Consulta de Ministros de
Relações Exteriores da OEA.
Bem na ponta da Punta as estátuas de sereias feitas com o
lixo sólido que se depositam nos mares. Os restos carcomidos do capacho Colombiano
de tanto uso pelo Império a convocar a Reunião. As teses e decisões que geraram
as ditaduras militares de direita na América Latina sob o capuz da tortura de
algozes americanos: intervenção estrangeira como desculpa para intervir; segurança
contra a ação subversiva do comunismo internacional com senha para os golpes e
a Aliança para o Progresso para consolidar “il capo de tutti capi”.
E os olhos tontos de tantas fachadas luxuosas, ruas desertas
na fase do estio das douradas temporadas de verão. É tanto verde, verde
rasteiro, ao rés do chão, verde sobre antigas dunas, verdes para ladear os caminhos
sinuosos dos carrões de sonhos. Verdes no meio dos quais se erguem mansões de
tantos cômodos com se uma grande hospedaria fosse para apenas algum casal, seus
dois filhos e uma multidão de puxa-sacos e admiradores no frisson do verão.
Na praia, aquela face da Punta que se beira às ondas
revoltas das Praias Oceânicas. Em qual delas os dedos gigantes de uma mão
emergem das areias como se a mão de um zumbi fosse, a pedir socorro ao presente
do enterro vivo da história. Em qual destes dedos encontrou Guevara, Brizola,
tantos latinos americanos perplexos com a expulsão de Cuba. Na Oitava Reunião
de Punta Del Este o dragão queimava o destino de uma geração e roubava dela a
construção dos próprios passos.
Não parece, mas em Punta Del Este alguns pobrecitos clamam
por comida. São poucos, invisíveis aos filtros de ar condicionado dos vidros
fechados na velocidade de conta-giros enlouquecidos. São fugitivos do abraço
que os retém bem para o interior da Punta, para longe das praias e dos
balneários. Com Maldonado e San Carlos a reter-lhe o desejo de examinar os
ricos como os ricos são.
Em Punta Del Este toda a Cachoeira de práticas escusas com o
único fito de acumular. E se a esta queda da água fosse possível tratar-lhe no
gênero masculino, o Cachoeira despejaria pedras e lamas, trapaças e artimanhas
igual a qualquer sujeito em franco processo de amealhar, ajuntar, enriquecer. O
Cachoeira tem o dom do mesmo ato de expulsar Cuba, exilar Brizola e matar
Guevara.
Na saída rápida e desejada de Punta del Leste, tonto de
tanta jactância, abobado com tanta gramínea, quase grita palavras de teor
anarquista: Professor! Doutor! Professor! Doutor! Professor! Doutor! Num
roteiro tão longo que a paisagem foi se transformando e o automóvel voou baixo
na ruta 9.
Algumas horas após, uma vez havido ultrapasso o Arroio Chuí,
ali onde ele se despeja no mar, o olhar para o sul enxergava a ironia de ter
sido naquele carnaval de Cassinos que a Revolução Cubana que derrubara os Cassinos,
fora vingada pelos contraventores.
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