por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sexta-feira, 8 de abril de 2011

O bazar de Dona Zulmira - Emerson Monteiro

Às vezes, sem pressa, circulo os corredores secretos das lembranças, observando suas paredes marcadas de rabiscos misteriosos, tangido pelas mãos eficientes da imaginação. Vou reunindo elementos para reconstituir instantes agradáveis que transportam a mundos existentes em algum lugar nem sempre de acesso fácil, no entanto suficientes de neutralizar outros instantes atuais menos agradáveis, até aborrecidos, que as ondas da vida trazem às praias da realidade.
Numa dessas aventuras, voltei no calendário e revi quando cursava o terceiro ano primário, hoje terceiro do fundamental I, no Ginásio São Pio X, educandário das irmãs do silêncio instalado na Praça da Sé, em Crato, do lado de baixo, no prédio da Irmandade de São Vicente de Paulo.
Era colega de Hugo Linard, que já tocava acordeom nessa época. Sempre que havia sessão artística aos finais de semana, era ele dos números principais, pois Dona Chiquinha Piancó, nossa professora, nunca deixava por menos; Hugo daria seu jeito e traria o acordeom para essa apresentação, sendo ele um garoto franzino que devia arranjar o carregador e transportar o instrumento até o colégio; se não, nada feito.
Por ocasião da véspera de uma dessas sessões, Hugo e eu, saímos à procura desse carregador, conforme a liberação da professora. E aqui chego ao que quero contar, a visita que fizemos ao bazar de Dona Zulmira.
Ficava na Rua Miguel Limaverde, lado da sombra, antes da casa da esquina em que funciona a Ábaco. No prédio onde residia, logo na sala da frente Dona Zulmira instalara sua loja, formada de tudo que era presente, caixas e mais caixas nas prateleiras que iam do chão ao teto, forradas dos brinquedos mais incríveis, maravilhas dignas dos contos do Oriente.
Meu amigo desde que nos conhecemos naquele ano, Hugo nem prevenira do que faríamos. Eu jamais supunha existisse em Crato tais prodígios. Fiquei abismado, digamos assim, perante o estoque precioso da inesperada loja ali reservada.
Bom, após demorar o suficiente de ver a pilha de jogos de salão, palhaços, carros, aviões, instrumentos musicais, bolas de variados tamanhos, piões, bonecos coloridos, embalagens e embalagens de surpreendentes artefatos, retornamos ao colégio quais saídos da fábrica dos sonhos.
Depois disso, nenhuma outra vez tomei conhecimento da loja, o que restaria só nas dobras da ficção caso minha mãe, já bem recentemente, deixasse de contar ser Dona Zulmira uma sua parenta, prima segunda, por parte da família Bezerra de Menezes. Nessa hora, recordei a tarde longínqua e as emoções ocasionadas pelo incrível bazar que ela possuía, algo semelhante a papel mágico que escolhesse, algumas vezes, desempenhar, além (quem sabe?) da imaginação fértil de qualquer infância.

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