OS “HUNOS” DO CONGRESSO (editorial
do ESTADÃO, de 24.07.25)
“A título de salvar seu encalacrado líder, parlamentares bolsonaristas
não se importam em tumultuar o País com ameaças de impeachment de ministro do
STF e a defesa de uma inaceitável anistia.
A horda bolsonarista instalada no Congresso reagiu às medidas cautelares
impostas ao ex-presidente Jair Bolsonaro para gritar a quem quis ouvir: a
partir de agosto, com o fim do recesso parlamentar, a prioridade dessa turma
será trabalhar pelo impeachment do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo
Tribunal Federal (STF), reavivar o projeto de anistia aos golpistas envolvidos
no 8 de Janeiro, definidos por eles como “presos políticos”, e desengavetar um
projeto de emenda constitucional que acaba com o foro especial por prerrogativa
de função para crimes comuns, mantendo-o apenas para a cúpula dos Três Poderes
e o vice-presidente da República – engenharia nada sutil para tirar do Supremo
processos como o que está em curso contra Bolsonaro. O grupo de parlamentares,
liderado pelo PL, partido do ex-presidente, também planeja organizar um
discurso “unificado” e organizar atos pelo Brasil em apoio a Bolsonaro e contra
as decisões do STF.
Nenhuma dessas iniciativas tem grandes chances de prosperar na Câmara e
no Senado, mas esses liberticidas estão mais interessados em outra coisa.
Apostam, antes de tudo, em sua capacidade de espalhar brasas onde já há fogo e
levar adiante pautas que funcionam como bandeiras simbólicas para mobilizar a
militância, difundir a falsa ideia de que o País está sob uma ditadura do
Judiciário, servir de arma para o discurso vitimista de Bolsonaro e, sobretudo,
produzir inimigos e criar um ambiente de convulsão social. Para essa tropa,
como resumiu a senadora Damares Alves (Republicanos-DF), só há dois inimigos a
enfrentar: Lula da Silva e Alexandre de Moraes, como se culpados fossem pelas
sanções impostas ao Brasil por Donald Trump.
Nada surpreendente para um grupo que representa um ideário que se fez no
caos, na mentira e na distorção da realidade – e disso se alimenta. Não se deve
tirar-lhes o direito de espernear e produzir factoides para satisfazer os
próprios delírios, pois afinal vivemos numa democracia. Mas não nos deixemos
enganar pela natureza da coisa. Assim como ocorreu com os vândalos golpistas
que, entre o fim de 2022 e o início de 2023, ultrapassaram a fronteira da
liberdade de expressão e de mobilização, está-se diante de mais um capítulo do
longo enredo de desprezo do bolsonarismo pelas instituições.
Fiel à violência política congênita do seu principal líder, o
bolsonarismo sempre se mostrou como um ideário retrógrado, personalista e
antinacional, mas hoje seus sabujos só se prestam a uma causa: proteger o
encalacrado padrinho.
Para tanto, vale tudo, especialmente a retórica destrutiva que afronta
instituições, intimida adversários e despreza a paz social e política desejada
pela maioria dos brasileiros. Pugnar pelo impeachment de ministros do STF,
demonizar o Judiciário, pregar uma anistia “ampla, geral e irrestrita” ou
alinhar-se vexatoriamente a Trump em sua ofensiva para prejudicar o Brasil hoje
equivale àquilo que, no passado recente, destinou-se a desacreditar as urnas
eletrônicas, instilar dúvidas sobre o processo eleitoral e criar o clima para a
ruptura.
Vale tudo, desde que seja a serviço de uma causa que nada tem a ver com
as reais necessidades do País nem com o suposto vezo autoritário do STF. É tudo
apenas para salvar Bolsonaro da cadeia – algo que, na sintaxe bolsonarista,
equivale a salvar a democracia. Mas é pura malandragem, pois, como se sabe, o
mito fundador do bolsonarismo jamais pensou em outra coisa senão nele mesmo e
na sua família.
Esse método está no manual do guerrilheiro bolsonarista, que ensina a
tumultuar para triunfar. Bolsonaro passou a vida destilando ódio em seus atos e
falas – seja como mau militar, quando manchou a farda com sua indisciplina,
seja como deputado, quando defendeu o fechamento do Congresso e o fuzilamento
de adversários, seja como presidente, quando ameaçou jornalistas, desacreditou
o sistema de votação e sabotou a vacina contra a covid-19 só porque foi
produzida por um adversário político.
Como toda força reacionária e destrutiva, os bolsonaristas atuam como os
hunos: por onde passam, nem grama nasce.”
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