por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



segunda-feira, 31 de agosto de 2015

  Para ler em 2050

Tentativa de resumo de um texto do pensador português Boaventura de Sousa Santos. Texto que explica nosso tempo e como o avaliaremos daqui a 35 anos. Usarei outras ordens e resumirei as sentenças. Vamos lá.

Esta é uma época que imaginou excessivamente o futuro e terminou por se refugiar apenas no passado. E nesta época operam simultaneamente três poderes não democrático: capitalismo (trocas desiguais entre seres humanos supostamente iguais), colonialismo (naturalização da discriminação invertendo a equação tornando provocadores às vítimas) e patriarcado (estigmatização das mulheres e das orientações não heterossexuais) servindo-se de três outros sub-poderes, religiosos, mediáticos, geracionais, étnico-culturais, regionais. Nenhum sendo democrático se tornaram a base da democracia possível (democracia-realmente-existente).  

Nesta esteira, no estilo invertido daqueles paradigmas de linguagem do livro 1984 acontece o seguinte: substituição da causalidade pela simultaneidade, da história pela notícia, da memória pelo silêncio, o futuro pelo passado, o problema pela solução. Isso levou a: atrocidades sendo atribuídas às vítimas, agressores vangloriados na coragem da luta contra agressões, ladrões são juízes, as nefastas consequências das decisões de quem decide os reduziu a uma moral minúscula.

Vivemos numa época onde excessos são vividos como carência: a velocidade nunca chega a ser suficiente; destrói-se com justificativa na urgência do construir; o ouro é o coração da vida, mas com a forma de uma nuvem; todos são empreendedores e as provas em contrário são proibidas pelas provas a favor; a adaptação é tão fluida que não se distinguem adaptados de inadaptados; criaram-se campos de concentrações da heterodoxia (pela cidade, bares, discotecas, drogas, Facebook).

A realidade transformada em embalagem de venda. Paisagens são pacotes turísticos; fontes e nascentes são engarrafadas; desigualdade é mérito; miséria é austeridade; hipocrisia, direitos humanos; guerra civil descontrolada, intervenção humanitária; guerra civil mitigada, democracia; a guerra é a paz infinita; Guernika é apenas um quadro e catástrofes são apenas entretenimentos.

Assim as virtudes são cultivadas como vícios e vícios como virtudes; não se enaltece qualidade morais e éticas, apenas se degrada, avilta e nega a qualidade e virtudes do outro; acredita-se que a escuridão ilumina a luz; a opinião pública é igual à privada de quem tem poder para publicar e “o insulto tornou-se o meio mais eficaz de um ignorante ser intelectualmente igual a um sábio”.

Uma civilização assim tende a ver gente demais e em nome de que nada contribuem para o bem-estar e, assim, começarem a descarta-las: velhos, imigrantes, jovens das periferias, dependentes químicos etc. E mais ainda o radicalismo que surge é de natureza estagnada e imobilista, movidos pelo tempo e falta de tempo, tornou a esperança exigente e cansativa; optando pela resignação.

Conquistou-se a simultaneidade dos deuses com os humanos, comercializando-os nos três mercados celestiais existentes, o do futuro para além da morte, o da caridade e o da guerra. Muitas religiões surgiram, cada qual parecida aos defeitos atribuídos às rivais, mas todas sendo o que dizem não ser: mercado de emoções.   


E conclui: a época criou um campo de plantas ruins como a última realidade da história, tentando esquecer o mais poderoso herbicida que existe para tal: a utopia.  

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