por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



sexta-feira, 29 de março de 2013

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Ele nasceu no Crato, interior do Ceará. Foi para o Recife. Lá, integrando o grupo Nuvem 33, fez-se músico vanguardista. Anos depois rumou para São Paulo. Depois de trabalhar com Tom Zé (poucos são tão vanguarda como TZ) e criar o grupo Papa Poluição, pôs-se ainda mais à frente, desta vez na Lira Paulistana de Itamar Assumpção, Tetê Espín­dola, Premeditando o Breque (Premê) e Arrigo Barnabé. Resumidamente, essa é a trajetória do cara que pensou que poderia deixar a música de lado e embarcar no mundo da propaganda.
Em 1982 Tiago lançou Cabelos de Sansão, um LP marcante com o qual foi reconhecido por seus pares e por adeptos da vanguarda paulistana. E não só: impressionou também corações e mentes nos quais a modernidade latejava, impregnada do fruto tropicalista, e sonhavam em vê-lo frutificar e seguir calando fundo na alma da música popular.
Foi em Cabelos de Sansão que Zeca Baleiro ouviu Tiago pela primeira vez – e chapou. Passados trinta anos, dono de uma gravadora, a Candeeiro Records, Zeca relançou em CD o LP. E mais, agora em 2013 lança Baião de Nós, novo álbum de Tiago Araripe.
Abro um parêntese: Zeca Baleiro é um grande compositor. Ponto. Entretanto, e talvez por isso mesmo, sua atuação como diretor artístico do selo não tenha o merecido reconhecimento pelo bom trabalho. Graças ao faro apurado e a convicções musicais ímpares, Zeca volta e meia produz discos da maior relevância para a música brasileira. E não pensem que ele faz isso por dinheiro, não. Nem empata. Se bobear, põe grana do próprio bolso para lançar músicos nos quais acredita. Fecho o parêntese.
Em Baião de Nós, Tiago lança doze músicas inéditas, nove só dele, três em parceria com Paulo Costa e duas com Zeca Baleiro. Os arranjos têm a característica da obra que vestem. Misturam sons de órgão (tirados do teclado, que remetem aos anos 1970) com naipe de sopros, bateria, violões de seis, doze e sete cordas, cavaquinho, percussão, guitarras, baixo, gaita, piano, sintetizador, banjo, sampler, acordeom e coro.
A voz de Tiago tem personalidade. Diferente, ela empresta aos versos um timbre que os torna também peculiar. Assim é em “Feito Beatles” (TA): Todos os sonhos repousam no mar/ Em algum açude do sertão/ Memória das águas/ Nas linhas que traçam/ A palma da mão. E também em “Canção do Silêncio” (TA): A menor distância/ Entre a palavra e o silêncio/ Só o pensamento pode percorrer/ Só o pensamento.
Suas composições estão a serviço de um pensador que cria melodias. O ritmo tem de ser o que melhor se mostrar no ato da criação. Não há nada predisposto. Tudo soa natural como é da natureza do compositor assim ser. Um grande exemplo disso é “Nós” (TA), que no CD aparece em duas faixas, em versão original e atual.
A beleza desta e de outras músicas demonstra o talento que tem Tiago Araripe. Um cara que em boa hora volta do silêncio para entoar palavras, e que se atreve a voltar a esse olho do furacão que é o mercado discográfico.

Aquiles Rique Reis, músico e vocalista do MPB4

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