“Olha, a melhor coisa do mundo hoje é a paz. É a paz, é a união.
Porque a paz é saúde e a união é a grande coisa boa no mundo. E hoje em dia é
pouco o que a gente vive: é a paz. Mas o quê eu gosto mais é a paz e união.”
“O quê é que eu acho da vida é que nós mora aqui em cima
desse chão, mas aqui não tem nada nosso. O pessoal briga por terra, por isso
por aquilo outro, mas nenhum tem terra. Ele (Deus) deixou tudo para o homem
viver. Para o homem viver e não mendigar o pão do outro. Tudo o quanto é feito
na terra é da terra. A fonte mais forte que existe no mundo é a água. Nosso
povo faz e acontece, faz tudo, mas tem que ter a água. Nós passa sem o feijão
um dia dois, nossa passa sem carne três ou quatro, cinco dias, nós passa sem
essas coisas, mas sem a água nós não passa.”
Afinal de conta todos
nós vamos morrer. Mesmo quem está nascendo hoje, que tem toda a esperança da vida,
de viver uma vida longa vai morrer também e quando a gente morre o quê que
acontece?
“O quê é que acontece é que nós vamos ficar no limbo do
esquecimento. Vamos ficar no limbo do esquecimento. Eu posso morrer hoje minha
família chora, cai por aqui, por acolá, faz tudo em conta, quando é com os
tempos estão cantando, estão dançando, tão tudo, não se lembrou, acabou-se, eu
estou no limbo do esquecimento. Aquilo que eu pratiquei na terra aquilo
esqueceu-se, aquilo eu morri mas não vou me lembrando daquilo não.” (Entrevista
com Manoel Galdino, camponês, barbeiro e pescador de jangada nascido no
lugarejo de Siupé, morador de Paracuru e que tinha 87 anos na data da
entrevista para o Programa Paracuru Minha Terra Minha Gente).
Duas palavras têm força de presença universal na nossa cultura:
finados e defunto. Ambas funcionam na dinâmica do coração como um eclipse na
luz da vida. Nós os nordestinos temos por hábito ao falar de alguém que já
morreu apostando antes de seu nome a palavra “finado”. A palavra defunto é
usada com mais raridade, pois tenho a impressão que suas sombras são muito mais
amplas.
Hoje é o dia de finados, daqueles que já se findaram.
Viveram e por isso conquistaram o fim. Quem nunca findou encontra-se num
impreciso nada que admitimos existir como forma de se contrapor com a
continuidade do tempo, pois no tempo continuamente brota existência que sabemos
autoalimentada do que já existe. Em outras palavras: nada vem do nada.
A palavra defunto por mais que escureça meu coração tem uma
raiz latina muito interessante, assim como seu Manoel Galdino soube expressar. A
raiz da palavra latina para defunto tem o significado de aquele que cumpriu a
vida, mas pode ser também, a junção da partícula negativa “de” com o verbo que
em latim significa funcionar.
Por isso, embora não seja um cultor do dia de finados, bem
sei que ele é a liberdade do limbo do esquecimento. E com certeza é o
repatriamento dos nossos nesta continuidade do tempo. Maria do Carmo, a segunda
esposa de José do Vale Arraes Feitosa acaba de ligar-me dos Currais, a terra em
que um dia ele plantou pés de acerolas.
Naquele exato momento Paulo César o mais novo do primeiro
casamento e Diana Maria a mais nova do segundo casamento, estavam na cidade em
alguma padaria comprando pão e leite para a noite em família. E assim, todos nós
fugimos do limbo do esquecimento.
Um comentário:
O limbo do esquecimento ...Onde fica esse lugar?
É LÁ QUE IREMOS DESCANSAR?
eNQUANTO ISSO LEMBRO TUDO SEM PARAR...
QUANDO ENCONTRO O VAZIO NO SILÊNCIO, PENSO ENTENDER A MORTE QUE AINDA NÃO VIVI.
vC LEMBROU PESSOAS QUERIDAS.cONVIVI COM zÉ DO vALE E mARIA. cONHECI dIANA E pAULINHO AINDA CRIANÇAS... o TEMPO FAZ CRESCER A VIDA, E A VIDA ATINGE UM FIM.
Postar um comentário