por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



terça-feira, 18 de janeiro de 2011

notas soltas

é que às vezes
preciso beber
meu sangue

então não repare
nos meus lábios
rubros

é que nem sempre
sou pálido e tenro

preciso beber meu sangue
juntar meus ossos
encaixar a loucura
no vão encanto

é que por muito tempo
coçam meus dedos
salivam meus dentes
desce a baba
pelo canto
da minha boca
cortada

é que tenho
desde nascença
um corte fino
nos lábios

onde repousa
minha lucidez
asas de fogo
infância

é que a poesia
não está sob
a vigilância
do poeta

nem este
acima

do estalo
dos gravetos

dos uivos
das borboletas

da quietude
dos bisões

é que meus braços
procuram outra coisa
gente quente água-viva

abraço fecundo
fazer mais de um filho
fazer uma penca de filhotes

pela casa rosnando assobiando
festejando alegrando paredes
riscando o teto a cada salto
da cama

é que a tolice
de quem escreve
pode afugentar
um pássaro
prender o dedo
na porta

é que dói
ver o sangue gasto
(todo nos lábios)

e o piso pedinte
suplica uma gota
um pingo
nem que seja
do seu esmalte

é que a minha flauta doce
recusa nessa noite
o meu sopro

e sem blues
a vidraça embaçada
sinto dó das lágrimas

é que meus cílios
nessa noite
bela época

abanam-se
vaidosos
da solidão