por José do Vale Pinheiro Feitosa




Viva junto à alma mais próxima e compreenda que a proximidade é a medida da distância. Que a distância que os separa é este movimento maravilhoso da matéria e da energia. A maravilha é apenas esta surpresa porque esta proximidade é tão diminuta entre os dois e é a inesperada distância.

José do Vale P Feitosa



segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Amores Clandestinos


O filme “Amores Clandestinos” fez sucesso , nos anos 60. Vinha bem a calhar, dentro do contesto da época.Depois de comprar o ingresso, passar pelo porteiro, delegado de menor, entrava na penumbra da sala, e esperávamos o apagado de todas as luzes.
O único que conhecia todos os segredos ocultos era o Lanterninha. Focava cadeiras vazias, e focava por “descuido” aquelas ocupadas pelos casais, justo, os que fugiam da luz... Dos olhos da família, do preconceito social, e da própria timidez.
Tinham naturezas diversas, posto o dito: amores impossíveis, amores nascentes e crescentes...Amores dos amasses ( puro cheiro, puro sarro)...Amores tímidos, ingênuos e trêmulos ; amores despudorados, explícitos na “safadeza” do poder hormonal...Todos eram instigados , pela cumplicidade de um escuro técnico.
Muitas “pernas gordinhas”, (como a canção do Tiago Araripe), molhadas, sedosas, balançavam pés nervosos. Beijos de língua, de pescoço, de outras partes, outros pedaços do corpo... Como mãos, e bochecha do rosto!
Enlevada no enredo do filme, desligava-me da terra. , mas perdia meu olhar, muitas vezes, na doce tensão da espera.Um dia, ele chegou, e sentou-se numa fila adiante de mim. Encostou sua cabeça numa peruca canecalon, loura com a da Marilyn... Meus olhos desviados da tela ficaram lá, pregados e chorosos, naquele bandô total, que recebia afagos, e abraços.
Quando a fita anunciou o “THE END”, sorrateiramente mudei de lugar, e aproximei-me mais um pouquinho, pra descobrir na saída, se era azul, os olhos daquela diva.. O moço correu apressado, antes do acender das luzes. Enfim tudo claro! Eram dois olhos morenos. Olhos conhecidos, subservientes, corajosos e apaixonados....
Covarde, o meu gato!Estava lá, a musa de tantos brotos!Era assim, o cotidiano do maior entretenimento da City....
Divertia, aproximava, e escondia.
Transportava os nossos sonhos para o glamour hollydiano. Se não existisse a censura do Bispo, colada no mural do Café Crato, acho que não teria perdido nenhum drama escandaloso, que o cinema ensinava. Mas eu estava lá... Em todos de Marisol. Joselito, Shirley Temple, Walt Disney...Nunca, em “Amores Clandestinos” – (clássico com Sandra Dee e Troy Donahue – trilha sonora - Theme From A Summer Place... Linda!!!).
Namorei sem pegar na mão... Só no roçar dos braços. Mas não nego a presença do tesão, nas orelhas afogueadas. Namorei com cochichos no pé do ouvido. Com mordidas no pescoço, e balas pepper, zorro, ou anis.Namorei com os meus ídolos... Puros, românticos, sofredores, heróicos, belos, e gentis.
No Cinema não faltava: assovios, suspiros, gemidos, choros... Alguns até convulsivos. (Chorei assim, no filme Irmão Sol e Irmã Lua, e até na Paixão de Cristo).
A vida se harmonizava na sala de projeção.
Tempos sem analistas, psiquiatras...Tempos de sessão de risos com Jerry Levis, Cantinflas, o Gordo e O Magro, e Zé Trindade.
O Cassino de hoje é um campo de energia obscura. Ficou apenas o escurinho do cinema, na beleza deteriorada.
Perdemos a cortina grená. O lanterna iluminando a paixão dos casais...Foram-se o misturado dos perfumes, o mascarem dos chicletes Adams, o estouro das bolas do ping pong, na falta do beijo amado.
Era bom, até cochilar de viver, naquele ninho! Nada mais excitante, aventureiro e libidinoso, do que um encontro clandestino, na sessão das 4, no Cine Cassino.
O Lanterninha que ressuscite essa “Cratíadas”, como já fez Zé do Vale, noutro contexto.


Socorro Moreira


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