Minhas
noções de ecumenismo começaram bem antes de ter ouvido falar nessa palavra e
muito menos saber o que significava. Lá em casa, quando eu era acometido por
alguma doença, um parente médico era chamado. Logo após a saída do médico, atendendo
ao chamado de umas das funcionárias da casa, chegava a Comadre Chiquinha com
seus galhos de pinhão roxo e água de arruda, e com muita reza realizava os
trabalhos de afastamento e cura, que infalivelmente expulsava todos os
malefícios, feitiços e maus olhados, que com toda certeza tinha sido vítima.
Tratamento válido para todos os menores da casa, já para os adultos o trabalho
era feito à revelia, longe das vistas deles.
Tudo isso sob o olhar tolerante de minha mãe e tias, católicas
praticantes que, por não serem fundamentalistas, respeitavam as crenças dos
outros. Afinal, na família tinha de não crentes a crentes de vários credos,
todos aceitos sem censuras, além de que, por via das dúvidas era melhor não
arriscar com as forças ocultas.
Já adolescente,
por várias vezes na companhia da “tia” responsável pelo afastamento dos maus
olhados, visitava um Terreiro de Umbanda que existia no Alto do Seminário, no
Crato. Não acreditava muito naquilo tudo. Achava muito confuso, muitos deuses,
santos e orixás juntos, sincretismo complicado. Preferia acreditar nos
evangelhos. Mas, confesso que gostava do ritual do terreiro, música, dança, muita
cachaça, nenhum ensaio, cada um se manifestando como queria, espíritos
“baixando” para dar algumas ordens, pedir coisas e adivinhar
passado e até mesmo o futuro, como por exemplo que “breve iria chover ou que breve
algum figurão morreria”.
Fomos
alfabetizados no Instituto São Vicente Ferrer, escola pertencente à Paróquia do
mesmo santo. O pároco, padre Frederico Nierhoff, estava
alguns anos à frente do fundamentalismo religioso de muitos cratenses,
que entre outras coisas discriminavam as famílias protestantes que começavam a
se estabelecer na região. Com a maioria das escolas primárias particulares ligadas
à igreja católica e dirigidas por religiosas quase beatas, ficava quase
impossível matricular filhos dessas famílias. Mas, para o padre Frederico, matricular
filhos de famílias protestante era um ato, talvez de caridade, não era pecado
nem impedimento religioso.
Nos
anos 70 do século passado, em Praga, saindo da faculdade depois de uma prova
considerada difícil, rumo à estação do metro e passando em frente à Igreja
Ortodoxa dedicada aos Santos Cirilo e Metódio, um colega do Iraque me chamou
para entrar e orar para agradecer a Deus. Ponderei, já subindo os degraus, que
talvez fosse falta de respeito já que eu era católico e ele muçulmano, ao que
ele me respondeu: mas o Deus é o mesmo.
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